domingo, 31 de janeiro de 2010

17

Aquela sensação de estar sozinho mesmo sabendo que não está. O assustador contrário da paranormalidade que tanto inspira ficções cinematográficas. O sentimento de estar solitário no topo do Everest com o mundo inundado ao ponto de a água molhar a sola de suas botas de escalada.

Não que eu realmente não tenha ninguém. Pelo contrário, tenho amigos que morreriam por mim e que sabem da reciprocidade do sentimento. Tenho uma família que sempre se propôs a tirar o oxigênio dos próprios pulmões caso disto dependesse a minha felicidade. Pessoas, pessoas, pessoas. Não somente aquelas faces sem verbos ou timbres que enfeitam as fotos antigas de turmas não continuadas do colegial ou de uma viagem louca e inesperada pra algum território distante e inesquecível, mas seres humanos com toda a complexidade que tais relacionamentos verdadeiros exigem.

A questão é ter com quem compartilhar sentimentos mais íntimos. Nada destas superficialidades carnais, que não perdem a importância e muito menos a necessidade, mas que não entram agora no meu contexto semi-neurótico-depressivo de uma madrugada de sábado. Falo de alguém para fazer massagens nos pés quando estes forem maltratados pelas exigências diárias e implorarem por um conforto já esquecido entre sapatos, meias, calçadas e buracos não previstos. Alguém para quem eu disfarçe o garrancho na hora de enfeitar um papel de carta colorido com rimas e significados exclusivos de nós dois. Uma mão quente de unhas pintadas para elogiar estranhamente, comparando a tonalidade do esmalte com a sua palheta favorita que perdeu ao deixar em cima de um amplificador durante aquele show noturno de bebidas, rock e brincadeiras. O número de telefone mais recorrido de toda sua agenda. A pessoa pra te acusar de não prestar atenção em nada do que ela diz, quando o fato é que você queria lhe contar que sua memória se confundiu por, na verdade, prestar atenção a TUDO que ela diz, e assim embaralhar fatos, fotos, datas, razões, nomes e prioridades, mas no fim você só balança a cabeça e reconhece o erro, ou equívoco, ou seja lá qual for o nome dado porque a embalagem já não é mais tão importante quanto o produto final, e nunca foi. O wallpaper do seu celular, para admirar a todo instante. O lábio inferior que você morde. A coluna saliente que a palma da sua mão identifica no carinho. A causa daquelas crises de ciúmes que te impedem de ter um sono decente, visualizando o impossível em pesadelos críveis dentro do contexto desta insanidade saudável de carência simbiótica que carinhosamente apelidamos de amor.

A ociosidade mental me incita estupidez.
Erros, substituições, experimentos, máscaras e citações nunca levam ninguém a lugar nenhum.
E continuo nada sabendo e de tudo me enganando nesta brincadeira.
Por mais implícita que seja, a positividade é sempre existente: se meus passos tivessem ao menos um quinto da certeza e a estética de minhas frases, eu nunca as escreveria.

domingo, 24 de janeiro de 2010

Escrevendo sobre algo impossível de ser descrito plenamente ...

Escuridão parcial, daquelas suficientes para não reconhecer exatamente os objetos mas ainda assim saber que há algo lá.
De barriga para cima, coberto e contemplando o silêncio da madrugada, espero o sono vir.
No teto, as poucas luzes oriundas de lâmpadas acesas na rua invadem o meu quarto pelas frestas da janela, que originalmente serviriam apenas para possibilitar a circulação de ar entre o ambiente interno e o externo. Aparentemente a luz não se importa com as finalidades criativas humanas, então me concentro apenas em observar a projeção desta "janela luminosa" que paira exatamente sobre minha cabeça.
Sem mais nem menos, um vulto aparece na imagem anteriormente descrita. Uma sombra totalmente negra e de forma bem humanóide se apresenta como aquelas marionetes que fazemos quando crianças, com uma laterna em frente à parede. Começo a estranhar.
Com a cabeça inclinada, a figura levanta um dos braços e com dois dedos faz um sinal me chamando, como que para seguí-lo. Estremeço.
Como se o meu medo crescente não fosse absolutamente nada relevante, a imagem então começa a brincar de gestos, sabendo que eu a observava e não me movia. Faz, com os mesmos dois dedos que antes me chamavam, uma imitação de pessoa caminhando e reveza esta gesticulação com o convite de antes.
Viro minha atenção para o lado direito da imagem no teto, onde agora há duas cabeças humanas me olhando. Masculinas, carecas e transparentes, são estáticas e sem feição alguma. Acho tudo muito estranho e logo me indago, em voz alta, se tudo aquilo não se tratava de um sonho. Imediatamente, como que ativadas pelo meu medo e curiosidade, as duas cabeças gritam, frenéticas e em tom de deboche provocante, afirmando que aquilo era sim um sonho. E quanto mais concordavam com a minha suposição, mais amedrontado eu ficava e, proporcionalmente, mais as duas cabeças flutuantes utilizavam caretas e sotaques para me encurralar psicologicamente.
Procuro um auxílio em meu irmão, sabendo que dormia na cama ao lado e, se tudo aquilo realmente estivesse acontecendo, ao menos dividiria o sofrimento comigo.
Ao virar a cabeça para direita, vejo que meu irmão também está, do mesmo modo esquizofrênico (útil em um manicômio, mas não em uma madrugada de domingo), gritando que era sim um sonho, que era sim, que era, sim, sim, sim.
Então, entre a cama do meu irmão e a minha, como se ali fossem apenas as bordas de uma piscina, surge um busto de um garoto vestido em azul, se apoiando com os cotovelos na cama ao lado da minha e balançando a cabeça concordando com o que diziam as duas figuras do teto e meu próprio irmão alucinado. Não consigo ver até então como era o garoto, apenas sabendo que era isto mesmo pelo corte de cabelo, tamanho e modo de se vestir.
Neste instante, o som similar ao de milhões de abelhas enlouquecidas invadem o meu ouvido. Fico atordoado, com medo, paralizado, tenso e horrorizado com tudo aquilo.
Talvez pressentindo a densidade que esmagava meu peito e me impedia de clamar por socorro, o garoto parece querer me revelar o seu rosto. Extremamente lento, o garoto vai subindo a cabeça, jogando-a para trás pouco a pouco, até a hora em que vejo o queixo dele e sua testa substitui o que antes era a nuca.
Seus olhos são dois poços infinitos de brancura. Não há íris, não há nada. Só branco, branco e branco. E irritação em sua volta, como se aqueles olhos nunca tivessem sido protegidos por pálpebras e agora demonstrassem o cansaço a e dor de não cochilar.
Contente com o acordo quase unânime entre os presentes quanto ao meu estado de sonho, o garoto balança a cabeça de um lado para o outro, ainda na desconfortável posição jogada para trás, e então tira a língua, com o dobro do comprimento natural humano, de dentro da boca e a move igualmente.
Então eu não me contenho e tento gritar.
Até então eu mal conseguia falar. Só quando muito me esforçava eu conseguia soltar alguns gemidos baixos e inaudíveis.
Mas nesta hora nenhum amplificador profissional poderia competir com a potência de minhas cordas vocais.
Dou um grito desesperado e acordo, às 5 da manhã, no mesmo quarto que serviu de cenário para o meu pesadelo. Demoro horas pra dormir e me contenho em dizer que estava apenas sonhando quando, no dia seguinte, me perguntam o porquê do rugido desesperado da madrugada anterior.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Tiê, internet e um pouco de francês

Não sei quantos vão ler. Não sei nem exatamente o que vou escrever. Só sei que este parágrafo inicial já foi escrito e desfeito tantas vezes que ninguém poderia sequer supor o número real. Então fico com este, já que nenhum seria bom o bastante pra demonstrar a minha falta de habilidade, nas linhas a seguir, em descrever uma amizade que, apesar de ainda jovem, já está marcada por vários momentos de grande intensidade.

Tudo começou na curiosidade de saber quem era aquela menina loira e misteriosa sentada ao meu lado, de camisa xadrez vermelha e óculos. Quieta, analítica e atraente.
Muito tempo passou sem eu nem saber o nome dela. Mas ainda assim insistia comigo mesmo que, apesar de toda a minha falta de jeito e anti-sociabilidade, um dia iria ao menos desenvolver um diálogo decente com aquela figura.

Realmente não sei como, quando ou o porquê de começarmos a conversar. Provável que algum recurso em comum da internet (que descobriria mais tarde ser um dos grandes vícios dela) tenha cruzado nossa frente. Mas o que importa nesta primeira etapa da história é dizer o quanto foi legal isto ter acontecido. Eu não tinha noção de que estava pra conhecer uma pessoa de grande importância pra mim.

Diálogos por horas pela internet, mensagens de celular e afins e descobrimos uma relação agradável, sincera e com muito escambo cultural. Em uma das infinitas conversas, combinamos de assistir uma artista que gostávamos em comum. Se o show foi legal, passar um tempo conhecendo-a melhor foi indescritível. Risadas, gestos, apresentações e um dia pra lá de memorável.

E, como uma Ferrari sem freios descendo uma imensa ladeira em dia de chuva, me pareceu que as coisas estavam deixando para trás a velocidade da luz, tamanha rapidez e brevidade entre fatos, dias e contos. Festas, baladas, sorrisos, shows, ensaios, família, casas, filmes, músicas e comecei a ver as coisas por um prisma diferente. Caminhar nas ruas rindo de abacaxis, bonobos e direções confusas. Jazz, Stellas e comédias de improviso.
De repente sua presença virou minha nicotina. E se passar o tempo junto fossem seus adesivos, eu já estava quase tirando o filtro da cigarrilha. De uma hora pra outra viramos a boa companhia para ver aquele filme alternativo com um edredon.
Eu sempre estive consciente de que procurava o acesso de uma avenida através de uma rua sem saída. Mas sussurrar "petit chansons" em plena madrugada é mais perigoso que o Bin Laden na presidência da American Airlines. Acabei gostando.

Como toda boa história que se preze, há momentos tristes. Mas estes não ganharão lugar aqui. Pelo menos não oriundos de meus dedos e teclado. Se brigas, mágoas e talvez certa decepção tentaram infectar alguma vez este organismo chamado amizade, o riso característico de seus momentos de felicidade, a serenidade dos atos cotidianos e toda a consideração e carinho imensos adquiridos até aqui são o antibiótico perfeito para minhas noites de sono tranquilas e saudáveis.
O que importa, daqui em diante, é o agora. É a sinceridade (abundante em sua personalidade forte)! É uma amizade legal, divertida e cheia de histórias. Uma amizade presente e recíproca. Onde ambos se preocupam pelo bem-estar do outro. E sempre estão lá quando necessário.

Eu realmente sinto muito se deixei coisas de fora, ou se era esperado um texto melhor. Mas acho que, entre nós dois, muito bem sabemos de toda importância, carinho e cuidado que temos um com o outro. Esta é uma relação de amizade que realmente gosto e que cultivarei até o fim das forças.
Tanta coisa que queria escrever e achei que não podia. E tantas que nem precisei porque você já as sabia. Mas tudo isso foi só um jeito de enfatizar como você também é muito especial pra mim e merece tudo de bom na sua vida. E como ficarei feliz em aplaudir, de pé e alegre, cada sonho seu realizado.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Para pés delicados!

A população da cidade de São Paulo pode ficar mais tranquila agora: os delicados e frágeis pés do topo da elite paulistana estão agora sob excelentes cuidados profissionais, tudo grátis, com organização da prefeitura de São Paulo e então, pela lógica matemática das coisas, pago diretamente com nosso querido dinheiro. Então não fique desanimado: a próxima vez que seu chefe pisar em você, ao menos haverá a certeza de que o investimento retornou a você! É o povo zelando pela ótima condição física daqueles que nem o sobrenome da empregada doméstica, que todo dia viaja até seus sumptuosos lares para deixar o local extremamente higienizado, organizado e ainda por cima aquecer o seu alimento diário, sabem!

Digo isto pois acordei hoje de meus belos sonhos desconexos e me deparei com uma reportagem do SPTV sobre aulas gratuitas de spinning, promovidas pelo evento Bike Tour, no município de São Paulo. Um detalhe curioso é o local escolhido para tanto: o shopping Morumbi, na zona sul da capital, onde, como todos sabemos, a população realmente é muito carente e não têm condições de bancar uma academia, equipamentos de ginástica e professores particular.

Indo no site oficial do evento, é possível ver os lindos logotipos da prefeitura e do governo de São Paulo homenageando tal mobilização e se dispondo, inclusive, a organizar as ações do que lá estão nomeados como "parceiros".

É comovente a preocupação com o bem-estar da população.
Bairros como o Morumbi, Brooklin e laia adjacente precisam mesmo deste tipo de gasto.
A alimentação, hospedagem, educação e auxílio aos moradores de áreas devastadas pelas recentes chuvas podem esperar. Não é tão importante quanto a malhação de algumas esposas de ricos empresários que só pedem pela queima daquelas calorias adquiridas por aquele gigantesco pedaço de torta de morango com chantily comprada na doceria enquanto esperava que o lindo cachorrinho da família terminasse o seu banho semanal no Pet Shop da região.

Não entendo como alguns podem criticar estas atividades. Eu, particularmente, quase chorei quando uma pedagoga sorriu, toda realizada em frente as câmeras, e disse estar "sentindo que fez o dever de casa".
E vocês ainda querem levantar monumentos parabenizando trabalhos precocemente interrompidos como os de Zilda Arns? Martirizar charlatões como aquele filho hippie de marceneiro que vagabundeava com mais doze amigos e foi muito bem preso, julgado e condenado à cruz? Que indecêndia! Sejamos solidários e tenhamos bom senso: que prioridade seria maior que a satisfação egoísta de uma endinheirada às custas de indivíduos como nós, pés-rapados?

Sugiro que, ao menos dessa vez, façamos um pequeno sacrifício. Dessa maneira, ao levarmos um chute no traseiro após rastejarmos por quadras e quadras em busca de um emprego qualquer, mesmo que humilde, mas que nos sirva para ao menos tentar pagar as dívidas e manter uma certa áurea de dignidade, saberemos, assim, que foi feito pelas pernas exercitadas de um glutão saudável.

Mente ... Ira ... Mentira

Engraçado como algumas vezes nós só realmente percebemos se gostamos ou não de alguma coisa, ou se a queremos ou não, quando é tarde demais. E desta vez a redação é sobre algo consideravelmente mais fútil que o amor.

O dia daquela balada que você tanto esperava ir finalmente chegou. Banho, perfume, barba feita, fila e começa a brincadeira.
No começo a sensação é bárbara. Tanto tempo que você não aproveitava para se divertir, "tirar ondinha", enfim, não ligar pra problema nenhum e seguir a intensidade do momento. Você já havia bebido umas cervejinhas, então alegria não era o problema.

Entrando pelas portas, a cena é o óbvio e verdadeiro estereótipo de qualquer estabelecimento do tipo: a escuridão disputando seu lugar com os flashes psicodélicos como se um prêmio fosse prometido ao vencedor, sofás públicos esmagados por corpos libidinosos atuando uma atenção ao diálogo como se realmente houvesse prioridade entre o amor verdadeiro e a diversão casual, a música frenética tão densa que você pode carregá-la nos próprios ombros como um Atlas mitológico confundindo a Grécia com uma pista de dança qualquer, as silhuetas virtualmente indistinguíveis seguindo o fluxo musical e criando uma linguagem única e inexplicável como só a raça humana é capaz de fazer. Excelente.

Nâo precisaria mencionar que a primeira parada nesta longa estrada é o bar, mas assim faço por vontade descritiva.
É impressionante como uma simples estrutura divisória se assemelha mais a uma doce bala que cai em cima de um formigueiro do que um obstáculo construído em favor da organização geral.
Entre eu e toda humanidade expremida no local não há mais nenhuma individualidade quando a questão é a busca por líquidos (alcoólicos ou não). Como tentamos em vão atrair a atenção das garçonetes, neste momento, absolutamente não nos difere a recém-nascidos frios e famintos clamando pela urgência da mãe displicente.
Consigo a minha tequila. É dada a largada.

A música ruim até seria irrelevante na possibilidade de conhecer alguém legal. Alguém? Conhecer? Como se aprofundar na vida alheia quando surdos e sem vontade de buscar outros modos de expressão? Como se interessar de fato nas feições, roupas engraçadas, hábitos estranhos e cicatrizes de personalidade de uma pessoa se estão todos perdidos entre olhares, lábios, mãos e sentidos elevados artificialmente? Não. Minha vida agora é de presidiário: em silêncio, sentado, com leitura em dia e ambiência sonora de qualidade (apesar de a mesma ser relativa e duvidosa). Não sou mais uma coruja, indiferente à selvageria do breu e comunhão de organismos sem gênero/número/grau para finalidade reprodutiva, perdida na própria boemia. Minha barba por fazer coça, reflexo da mente igualmente irritada pela dúvida de estar ou não ali.

Estar com os amigos é ótimo. Este é o lado bom e o antídoto para o meu prazer. Conversas, piadas, histórias. A intimidade faz com que um resmungo soe como poesia cotidiana, daquelas que lemos em placas de caminhão e julgamos como ordinárias, mas que no fundo sabemos que é a realidade. Compro minha segunda ou terceira Heineken.

No meio do período de permanência já me encontro em angústia.
Por que não é mais tão legal quanto antes?
Eu esperei e quis tanto estar aqui para agora reclamar? O que aconteceu?
A vida aconteceu ...
Depois de broncas divinas, estômagos de aço e perdas irremediáveis, não há mais graça nisto tudo. Meu sinal já é amarelo e toda a pista livre não é de grande valia se não pretendo avançar pra segunda marcha. É fazer comédia em frente ao espelho.

Depois de um tempo, minha vontade é de escrever. Mas sem papel, caneta ou espaço, meu cérebro vira um bloco de notas. Inútil dizer que em pé no meio da multidão e cercado pelo som alto, eu estava - vamos assim dizer - escrevendo na superfície da água. Como chegavam, as idéias iam. Bumbo, bumbo, caixa e meu versos se misturavam com a melodia que pairava. Rima, prima, imprima, guitarra, baixo, grito, cadê o silêncio, cadência, lenço. O que tinha pensado? Tenho que terminar o meu livro do Jack Kerourac que deixei em cima da cômoda ao lado da minha cama no apartamento do meu pai. Opa! Onde vocês estavam? Está tocando Oasis? Aquele cara sim sabia escrever. Kerouac. E pensar que ainda tem outro livro dele que comprei. Sim, sim, vamos pegar mais cerveja. Minha mente, meus textos, minha fala se embaralham e eu não consigo pensar e nem pedir truco. Não que eu estivesse jogando. Mas hoje em dia não passa disso, não é? Jogos. Blur. New Order. E a nova ordem é fingir que está tudo bem. Olha só aquela lá! Ah, não, de jeito nenhum. Dança. Bagunça. Heineken. O meio no fim. E depois a revisão da metade. Um grupo de meninas. Os olhos. As poses. Que piada. Me dê uma folha de papel e uma caneta. Não vou pedir, mas eu queria. Aceito cigarro, cigarra, se agarra aí que eu não quero mais nada. Queria paz, mas atualmente estou aceitando até pás pra me enterrar e sumir. Caótico e sem ordem cronológica já nem ligo pra sintaxe de imaginação e decência de coordenação. Vistoria na fila do banheiro indagando se é "cocaine" ou normal. E eu só quero ir no banheiro, licença, por favor? Farto dos fatos sem fotos, e de toda essa sonoridade das palavras. Pseudo-argentinos forjando sotaque para conquistar presas. Mais Heineken. Mais poesia na minha mente. Menos rimas, menos ardente. Cansei, quero ir embora para poder dar sequência ao meu texto, algo que não cheire fumaça e tenha uma ordem legível pra quem quiser decifrar.

Fora da balada finalmente.
Sendo honesto, não gostei.
Bem legal unir o pessoal. As brincadeiras. Os registros.
Mas minha fase agora beira a espiritualidade sem título.
Esperamos o metrô abrir contando casos e rindo.

Casa. Cama. Sonhos. E o tic-tac mecânico do meu relógio-disco-de-vinil com foto dos Beatles como único compasso regente ecoando em meus ouvidos. E eu, recluso por um bom tempo.

sábado, 9 de janeiro de 2010

Matemática desesperadora

Filosofando neste sábado à noite, acabei por fazer cálculos que realmente me deixaram assustados.
Me acompanhe:

- O sono humano deveria, teoricamente, ter em média uma duração de 8 horas diárias.
- O movimento de rotação terrestre, responsável pelo padrão do que consideramos a duração de um dia, demora 24 horas para se completar.

Considerando estas duas frases temos que, em um dia (de 24 horas de duração), dormimos oito horas.
Dormir por oito horas, indica que nos sobram para fazer TODO O RESTO, 16 horas diárias.
Se você pegar o período de três dias, temos:

- 3 x 8 horas de sono = 24 horas de sono
- 3 x 16 horas que sobram = 48 horas que sobram

Ou seja: a cada três dias, você passou um dia inteiro dormindo e somente dois dias para VIVER. No período de um ano, você passa aproximadamente 121 dias dormindo. Considerando que tenho 21 anos, eu passei, em média, 7 anos DORMINDO!!!

Eu não quero tirar a importância do sono, nem nada parecido. Mas me desespera saber que a cada três dias, eu só tenho dois para realmente viver. Para ver, ler, ouvir, sentir, cheirar, conhecer, pensar, contar.

Nós humanos só VIVEMOS, realmente, dois terços de nossa vida.
Gastamos um terço de nossas vidas, 33,3% aproximadamente, deitados em uma cama, sonhando, dormindo, inconscientes. Perdemos todo este tempo sem nos acrescentar nada além de um pouco de energia.

Isso me assusta.

Sábado

Você acorda. Meio tonto, todo confuso, sem saber exatamente quando, como e porque. Imagina apenas ser relativamente tarde, pois o intruso Sol consegue de algum modo iluminar consideravelmente o seu quarto, apesar de a janela estar fechada. Já é possível distinguir móveis, objetos e espaços vazios.
Levantando, procura o relógio mais próximo pra saber a hora exata.
Pega o celular sem nenhuma ligação ou mensagem nova e se espanta ao descobrir que já é uma hora da tarde.
Sai do seu quarto atordoado pela abundância de luz que visita a sua sala, com a delicada e inconveniente permissão da janela de cortinas abertas.
No banheiro, lava o rosto para despertar verdadeiramente para o seu dia.
É sábado.

Já é de tarde. Sua mãe está toda cansada voltando do trabalho e abre a porta de casa para poder descansar no exato momento em que você está tomando o seu café-da-manhã, se é que assim pode ser chamado.
O clima está bárbaro. As poucas nuvens no céu dão um toque de casualidade ao horizonte, como se um artista resolvesse rabiscar em cima da própria obra para ela não parecer tão perfeita.
Mas a vontade de realmente fazer algo que exija o mínimo esforço de pegar o elevador e colocar os pés na calçada é quase inexistente. Falta objetivo. Falta um motivo para valer qualquer dedicação. Resolve que seu dia será light. Que não será um dia nulo mas que também será desnecessário fazer uma placa em sua homenagem.

Liga a televisão e consta o que já desconfiava: não há muitos programas interessantes no horário. Dois episódios de Friends assistidos e só. Ainda passei por um filme que já estava na metade (I Am Sam). Até gostaria de assistí-lo, mas se visse o final, me desanimaria alugá-lo para ver desde o começo. O que me valeu foi a lembrança de uma pessoa. A que me indicou o filme. Que me disse que é lindo e chorou. Aquela que ultimamente invade meus pensamentos em cada pequena ação cotidiana, me faz refletir sobre minhas ações e indagar sobre minha própria ignorância e covardia perante a vida. Enfim ... Ainda existem os livros.

Sentando no sofá, continua a leitura de Tristessa, um pequeno porém interessante livro de Jack Kerouac, comprado com R$ 8,00 em uma livraria Nobel no dia anterior, quando fiquei preso em um shopping center esperando a chuva cessar para poder ir pra casa.
Algumas páginas sobre um americano apaixonado por uma prostituta mexicana viciada em morfina, inspirações para músicas e aprendizado descritivo para futuros textos e estou pronto pro almoço.

Macarrão, sardinha, guaraná e uma carambola depois e me sento em frente ao computador. Twitter, orkut, alguns blogs, conversas no MSN, todo o disco do Little Joy pela milésima vez. Se isso não é vida boa, eu não sei o que é.

O dia não poderia ser completo sem um banho decente para anular o calor ambiente que, selvagem como raras vezes, me incomodava.

Para variar um pouquinho, sento novamente no sofá e coloco para rodar o DVD do show dos Los Hermanos na Fundição. Um excelente show. O último deles. Um memorável registro de uma das melhores bandas nacionais de todos os tempos. E a frase "e até quem me vê lendo jornal na fila do pão sabe que eu te encontrei" cantanda delicadamente por Rodrigo Amarante me remete ao passado, quando era eu quem recitava a mesma. Chega de DVD. Hora de computador novamente.

E aqui estou. Já ouvi Joy Division. Já ouvi Moldy Peaches. Já ouvi novamente Little Joy.
Não há recados no orkut, as janelas do meu MSN mal piscam.
Resolvo então escrever um post à margem da total futilidade para me distrair. Não há muito pra contar. Até existem coisas para analisar. Notícias, fatos, fotos. Mas qual o ponto também? Poucos lêem isto aqui de qualquer modo.
É mais um exercício de linguagem, um treino de digitação, uma atividade de aquecimento para a minha retórica do que um desabafo virtual ou documento de interesse público cheio de conteúdo e importância.
Outro dia eu escrevo sobre coisas mais importantes.
Hoje eu só queria simplesmente escrever mesmo.
Era isso ou sobre alguma etiqueta mal-colocada de um suéter verde musgo usado jogado no balcão de promoção em um pequeno e desconhecido brechó no centro de uma cidade interiorana. Optei pelo mais fácil.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Os meus 65 anos ...

Decididamente eu sou um idoso rabugento e preguiçoso penalizado com o fardo de viver no corpo de um jovem rapaz de 20 anos com a vida inteira pela frente.
No momento, às 21 horas de uma sexta-feira, já estou com sono, encostado em uma cadeira, a perna esticada em outra (me cansei por ter andado meia hora hoje), no escuro, ouvindo uma rádio de jazz e, antes de começar a digitar este texto, com as mãos cruzadas sobre a barriga já em formação montanhosa.Justificar
A verdade é que eu me cansei disto que chamam de juventude.
E não estou dizendo que eu quero "uma vida adulta" (pra não escapar do clichê). O que eu digo é que eu não ligaria de já pedir minha aposentadoria.
De me mudar pro interior, sentar na varanda em uma cadeira de balanço, lendo jornal e dizendo "olá" para os jovens que passarem em frente ao meu lar.
De sentar no sofá nas reuniões familiares, apenas olhando as mudanças de um ano pra ano e reclamando do volume alto da televisão.
De escolher uma só pessoa especial para passar todo o resto da vida, cuidando, conversando, vendo o telejornal, acordando ao lado dela e achando melhor sorrir como "bom-dia" por nunca saber se aquele sorriso será ou não o último.

Eu sei que parece um pensamento medíocre e inerte.
Eu sei que parece um sonho baixo.

Mas simplesmente cansei desta vida de baladas, músicas altas, rotatividades, pouco aconchego e muita malícia.

Não que eu deixarei de sair, me divertir, fazer amizades.
O que sucede é que eu não me espanto mais. Não me há mais novidades.
Eu não me surpreendo mais com as pessoas, com as atitudes, com os fatos.
Não me assusta mais o jeito como alguém age ocasionalmente. Ou acidentes. Ou coisas assim.

E isto é coisa de quem já viveu demais.
Só que eu ainda vivi "de menos".

Quem sabe eu seja um Benjamin Button mental?

Ou talvez simplesmente um louco prepotente e ignorante.

Vai saber ...
Só o tempo dirá.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Nota fiscal

Pensando sobre o valor que damos às pessoas e às coisas ...
Porque, geralmente, só enxergamos a devida importância de certas coisas quando já não as temos?
Digo isso inspirado na matéria de hoje do Fantástico sobre aquela menina que morreu no desabamento de uma pousada em Angra dos Reis, a Yumi Faraci.
O jornal mostrou uma entrevista com os pais, mostrou vídeos e fotos dela, contou seus hábitos e conquistas.
E eu não tenho nada contra esta mobilização, apesar de achar exagerada e sem sentido com relação às pessoas que nunca viram a menina na vida e agora colocam "luto" em seu nick do orkut sem saber nada sobre a garota.
O meu problema real na verdade é que, se ela não tivesse morrido, ninguém estaria dando o devido valor à menina.

Pela matéria, parece que a menina era muito legal, muito comportada, muito dedicada. Ela obedecia os pais, estudava, tocava violão. Tinha gostos peculiares e legais. E era realmente muito linda na minha opinião. Uma pessoa que aparentemente eu gostaria que estivesse por perto se por acaso fosse uma conhecida minha.

E aí fiquei imaginando o quanto existem pessoas do mesmo tipo muito perto de nós. Pessoas que conhecemos, que saimos, que vemos, mas que não damos esta importância.
Por que esperar as pessoas morrerem?
Qual a importância ou a necessidade de ficarmos saindo e perdendo nosso tempo com pessoas sem valor, que nada nos acrescentam ou ajudam, e deixar de lado as que realmente valem a pena, com quem podemos contar e nos apoiar?
Por que erramos tanto? Por que priorizamos tantas coisas inúteis, descartáveis, temporárias?
Por que jogamos pro alto relações com potencial em busca de algo estéril?
Por que queremos o sapato brilhante quando o bom e velho tênis rasgado é tudo que precisamos?

Estou tentando seriamente reverter estas manias bobas de minha parte. Isto bem antes de tudo isto acontecer. De ver a reportagem. Antes de tudo isto.
Não sei se estou fazendo as coisas do modo correto, mas me esforço para isto.
Pelo menos minha parte está garantida.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Brasil, Europa, qualquer lugar ...

Ver uma notícia estranha hoje no jornal ("I read the news today, oh boy...") me fez refletir.

A reportagem falava sobre como a busca por uma identidade fixa e padrão européia influenciava no aumento dessa xenofobia que há muito mancha a imagem do continente pelo planeta.
E um tópico curioso, para mim, do texto, era que os italianos limitaram o número de restaurantes especializados em comidas exóticas no país.

Agora o que me chamou atenção não foi necessariamente a medida de certo modo engraçada do governo italiano de preservar a cultura nacional, mas a hipocrisia do ato se considerarmos anos de história, principalmente na realidade brasileira.

Tempos atrás, quando muitos dos italianos fugiram de suas cidades e viajaram uma quase infinidade pelo mar em busca de outro lugar para seguir suas vidas, encontraram no Brasil um refúgio que podia não ser bom, mas que servia.

Italianos aqui sobreviviam apesar dos preconceitos sofridos, dos trabalhos impostos, das mentiras e afins. A realidade para eles era muito dura e abusiva. Muito mais do que a que é retratada e ensinada aos pequenos brasileiros que todo ano vão às escolas para limitar sua mente e fingir que serão alguém na vida.

Agora, décadas depois, a Itália resolve devolver na mesma moeda o que alguns de seus cidadãos ganharam aqui e em outros países.
Nem todo o dinheiro, informação, tecnologia e suposto conhecimento avançado que os europeus teoricamente teriam a mais se comparados com países em desenvolvimento, por exemplo, impediram que o que predominasse fosse a Lei de Talião.
No momento necessário de ser relativamente superior, de entender a raça humana como única, divergente sim em opiniões e culturas, mas totalmente irrelevante em uma tão querida evolução do planeta, a Europa se mostra tão madura quanto um aluno de jardim de infância.

Só espero que esta retroatividade filosófica se mostre apenas como uma infeliz exceção, e não como tendência mundial. Caso contrário, minha já abalada fé nas razões e emoções humanas se tornará inútil e obsoleta.